segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Do lugar da vida. Do espaço da arte.

Me propus a escrever esse texto ouvindo Philip Glass, talvez por ele ter causado a mesma experiência que a exposição da Fernanda Gomes me causou. Um exercício do olhar, do ouvir, do sentir.
Me arrisco a dizer que eles caminham juntos tanto em sua delicadeza quanto na sua simplicidade e elegância. Fernanda Gomes se apropria do MAM, de sua arquitetura pra fazer dela sua obra. Dispõe objetos, móveis usados no chão e “instaura” aquele espaço que deixa de ser um espaço de exposição pra ser a própria exposição.
São objetos antigos, desgastados pelo uso e pelo tempo, esquecidos por nós, querem falar do que somos e do que deixamos de ser, dessa vida que passou. Vai muito além de qualquer categoria de arte, muito além da apropriação dos espaços e dos objetos. Poderia ficar entre a escultura, pintura, instalação, mas seria um erro limitar seu trabalho a uma categoria de arte.
Lembrar, sentir, olhar, pensar sem ordem e com muita liberdade.
Vivenciar o trabalho da Fernanda Gomes no MAM é isso, uma experiência plástica que não se limita só ao espaço da obra de arte, mas extrapola os vidros da arquitetura de Reidy, vive a cidade e volta. Um caminho entre o interno e o externo que já percorremos ou que ainda vamos percorrer seja fisicamente ou sentimentalmente.
Lembro das palavras de Manoel de Barros em seu Livro sobre nada: “O olho vê, a lembrança revê, a imaginação transvê. É preciso transver o mundo." É essa experiência de destruição, reconstrução e construção. Uma experiência de cidade, de vida, memória e sentimentos.

Hearbeat

No domingo, fui de bicicleta ver Heartbeat no MAM. Na semana anterior ao Carnaval, eu tinha ido assistir a palestra que a Curadora, Ligia Canongia, iria fazer, mas ela acabou não aparecendo e ficamos num bate papo muito agradável, promovido pelo Núcleo Educativo, sobre a obra de Nan Goldin.
Após ouvirmos uma série de depoimentos registrados em áudio, diante da seguinte pergunta, "O que é expor Nan Goldin?", muitas questões foram colocadas: a da sociedade marginal e o que é exatamente estar à margem; porque ser compreendido como alguém que está à margem, cultura underground, exclusão, polêmicas de proibição, etc. Mas a que mais me chamou atenção, comentada pela Curadora Assistente do MAM e recorrente em vários dos depoimentos, foi o reconhecimento. Passei o bate papo quase todo só ouvindo as impressões e contribuições das pessoas, mas no final conclui, que de fato, a primeira palavra foi a que mais bem definiu a sensação que tive ao ver pela primeira vez aquele trabalho - que no Rio, deu nome a exposição, e foi editado com um número menor de fotografias - dois anos antes, na Mostra Elle@Pompidou, em Paris. Me lembro que cheguei ao final do salão, depois de uma enxurrada de obras femininas sobre ser mulher no mercado e na instituição de arte, as questões da escultura, o vermelho, o corpo, e lá estava ela: aquela sala escura, isolada, que apresentava uma sequência de fotos da mais pura intimidade. Uma intimidade bela que se doa sem receio para celebrar os afetos e dizer, isso é humano e isso é amor.
A experiência foi tão intensa que cheguei a derramar algumas lágrimas enquanto ouvia a voz imensa da Bjork surgindo no fundo. Fiquei agradecida por depois de tanto tempo, ter tido aquele tipo de experiência artística: a do afeto. E afeto pra mim é reconhecimento. As fotos de Nan Goldin, que vi então, pela segunda vez nesse último domingo, são gentis e oferecem algo que já conhecemos, e que portanto presenciamos no conforto de nos sabermos como aqueles tantos outros.
Não há muita complexidade na apresentação, tampouco no discurso da artista; aqueles são casais que compartilham afeto, e neles, está ela e estamos nós também. Abrir uma espécie de diário íntimo, uma vez que todas as fotos são de amigos próximos, é no mínimo doar um pedaço da sua vida, e essa gentileza das histórias cotidianas apresenta uma honestidade muito forte, às vezes compreendida como agressiva, sem rodeios.
Ainda que digam que seus retratos são um testemunho de uma sociedade marginal, aqueles casais anulam qualquer hierarquia, desmistificam os tabus das relações sexuais e suas discussões/representações artísticas (ou quaisquer outras discussões), porque tudo é muito anterior as possíveis diferenças.
A sexualidade, o corpo, e a maneira como trocamos afeto é crua na projeção e é a verdadeira de todas as vidas.
Por fim, sinto felicidade em saber que essas fotos estão lá, expostas, oferecidas e oferecendo a mais legítima das experiências: a do reconhecimento.

terça-feira, 12 de julho de 2011

Esse é um espaço para prolongarmos nossas opinioes sobre arte em forma de escrita.
Um exercicio de construção do pensamento e elaboracão de textos críticos.
Aqui, ensaiamos.